
Enquanto leio o jornal local, os jornais televisivos mostram as tristes imagens do caos proporcionado, em parte, pelas chuvas de verão Brasil afora, com destaque para algumas regiões do Estado de São Paulo e, principalmente, sobre o Estado do Rio de Janeiro.
Não é de hoje que os nossos verões tem sido particularmente assassinos, inclusive com uma tendência classista mórbida.
O que quero simplesmente dizer é que, embora a tragédia se abata sobre (quase) todas as cabeças, independente de cor, credo, raça, ou classe social, são as populações marginalizadas que mais sofrem com as enchentes e os deslizamentos de terra típicos de um país que pouco, muitíssimo pouco, faz em relação ao planejamento do desenvolvimento urbano e, particularmente, habitacional; e nada faz para frear a sanha gananciosa dos capitalistas de plantão, que buscam lucros à custa da vida alheia.
O resultado disso é que com as especulações imobiliárias que elevam os preços das moradias às alturas inconcebíveis, impraticáveis e imorais, ao nosso povo com menor ou quase nenhum poder aquisitivo só resta ocupar as regiões periféricas, os topos e as enconstas dos morros. Assim, a ocupação não planejada e, consequentemente, o desmatamento, abre caminho para as previsíveis tragédias.
O Diário do Grande ABC desta sexta-feira anuncia que no Rio de Janeiro já são mais de 500 mortos, 8320 pessoas desalojadas e 6270 pessoas desabrigadas. Sem contar as populações que estão sem água e energia elétrica e, ainda, devido ao isolamento provocado pelas enchentes e desmoronamentos, outras tantas que estão sem contato com o poder público.
Ou seja, não menos de 15.000 seres humanos no Rio de Janeiro afetados tragicamente por aquilo que o DGABC classificou como “a segunda maior tragédia climática no Brasil”, seguindo as justificativas comumente adotadas pelos governantes em geral, isto é, colocar a culpa na chuva, no clima, quando não nas próprias vítimas.
Inclusive o governador do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral¹, afirmou que “Educar é dizer não. Não se pode habitar essas áreas”… Como se viver embaixo da ponte (que também alaga) e morar no morro fosse alguma opção! Já o prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab, em recente entrevista televisiva, disse com todas as letras que o problema são as chuvas de verão; e o governador de São Paulo, Geraldo Alkmin, afirmou que obras contra enchentes não são feitas em 4 anos²…
Aí vem o Sakamoto³ (desculpem o trocadilho) com uma pergunta muito bem sacada: “E em vinte anos, dá?!”… Porque, como todo mundo está careca de saber, e Alkmin mais careca ainda está, o seu partido já vai para vinte anos à frente do governo de SP. Aliás, somando-se o tempo em que foi vice-governador e governador efetivo, Alkmin vai para 12 anos à frente do governo do Estado mais rico da Federação! E lamenta que em quatro anos não dá para resolver os problemas das enchentes. Pelo visto, vai pleitear a reeleição…
Voltando à “segunda maior tragédia climática no Brasil”… A não ser meramente pelo fato de que estes acontecimentos relacionam-se ao clima do nosso país tropical abençoado por deus e bonito por natureza, eles absolutamente não são tragédias climáticas! São tragédias provocadas por anos de descaso e desmazelo dos governantes, pela falta de política habitacional efetiva, pela especulação imobiliária, pelo desemprego estrutural e, em última análise, pelo modo de produção no qual baseamos a nossa economia, isto é, o nosso modo de viver, morrer (e por que não dizer?) matar.
A propósito, a foto que precede este artigo foi extraída do sítio da Globo, e é do Bairro Itajaí, em Santa Catarina. A legenda, fictícia, é tão somente uma provocação. A foto é de 2008, mas a imagem é a mesma de todos os anos! Como diria Marx: a história nunca se repete; quando se repete, ou é farsa, ou é tragédia. No caso da história brasileira, geralmente são as duas coisas ao mesmo tempo. [M.S.]
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Realmente você tem razão o descaso de nossos políticos é uma vergonha, vira e mexe metem a mão nos cofres públicos, aumentam seus próprios salários, enquanto que a população ainda sofre com estas catástrofes, mas como vc bem disse desta vez ela não escolheu classe A, B ou E, todos chorarm pelas suas perdas. O que nós podemos fazer? Como podemos dar um grito tão alto de protesto para que estes desavergonhados se mexam?
Jeanne, penso que dentro dos marcos do capitalismo, temos poucos instrumentos e poucas chances de mudar efetivamente situações como essas, mas como estamos muito longe de uma revolução social, acho que devemos usar os parcos instrumentos que temos, entre os quais a própria net, para divulgar as ideias, a nossa indignação, e pressionar os parlamentares, principalmente aqueles em que votamos – mandar e-mails para eles cobrando uma postura, pedir aos amigos e aos amigos dos amigos e quem mais poder também pressionar… Não é muito, mas já é um caminho.