Tudo em minha volta é silêncio que não se encontra. As folhas das árvores, balançando ao vento, contam segredos de outros países – não os ouço porque não os entendo em suas línguas bárbaras ou sutis; em suas e nossas gírias. Vejo as imagens tecidas pelo roçar das folhas nos troncos das árvores – uma visão natural com os sentidos que me foram emprestados. Chega a hora de devolvê-los. Ponho o coração de lado; a sensação é de letargia. Aguardo as cenas de minha vida inteira passarem em retrospectiva. Mas não! Somente o sorriso em seu rosto é o que me vem, e logo em seguida a saudade, que me faz sentir ainda mais humano, e ainda mais melindroso. Sinto-a tão presente que o calor de seu corpo conforta o meu em seus últimos instantes. Uma lágrima sua cai em minha face e rola até o canto da boca. Esse é o nosso último beijo – involuntário e tão sincero que desejara este instante outras mil vezes. Tudo passa. Esvanece. Abro os olhos para a escuridão momentânea. Apuro os sentidos. Levanto. Nada ouço. As folhas sumiram. Permanece o vento silencioso e tão denso que tenho a impressão de que poderia conter-lhe entre os punhos, mas os pulsos estão entorpecidos; fraquejam. Do outro lado da rua, o letreiro de neon piscando um “não há vagas” num compasso de uma bailarina ébria e sem par. Estendo os braços para fora da janela. Chuva. Frio. Na calçada logo abaixo passa alguém apressadamente; para. Olha para cima, para mim. E se vai.
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Imagem extraída do blog http://escritus-no-silencio.blogspot.com/