Falo como poeta Eu sou livre e não sabia Mas essa inconsistência do papel E essa minha língua vermelha, mordida Carne, nervos e sangue - o doce aroma Corte exposto no indicador esquerdo Eu sou poeta e não sabia. Eu sou poeta e não queria Conhecer a louca esperança tonta Que faz a escrita toda torta O vício da rima e o vício da mina Só, mano, é isso aí! Pra sair do contexto Nada do que faço é certo Eu sou o homem no deserto. Falo com o falo À flor da pele o hormônio O palavrão improferível A idade média da razão Eu sou o fruto que sai da terra O ofídio - tal como, frio e paciente Eu sou poeta e não sentia. Não sentia que era isso Essa coisa, esse asco Essa pedra bruta, esse fiasco Esse profundo fundorifício Detalhado na teta e na testa Marca de fuzil alemão Que eu nunca vi. Não, menina, eu não vou fugir Apenas quero me esconder Desse jeito meu (seu) de ser Da fantasia de sua boca na minha De seus lábios carnudos, calientes, Tangendo a fímbria do amanhecer... É que sou poeta e não dizia. Por isso agora falo. . [M.S. / Em algum momento do milênio passado]